Loja de roupa vegana de SP lança linha temática; leia entrevista com fundador

Yuri Gonzaga

A King55, que tem lojas na V. Madalena e em Pinheiros, na zona oeste paulistana, foi fundada em 2001 como a primeira marca de roupa brasileira que declaradamente dispensava componentes de origem animal.

Nos últimos dois anos, vem tornando mais claro seu posicionamento como uma grife em prol da causa, segundo o fundador, Amauri Caliman –recentemente, lançou uma linha de camisetas com a estampa “Vegan Forever”.1210_6100

Segundo Caliman, apesar da novidade passar uma mensagem explícita do estilo de vida vegano, a ideia geral do empreendimento é ser um exemplo discreto de que o modelo “cruelty-free” (sem crueldade) pode ser viável –as lojas, junto com a virtual, são seu único negócio, que é lucrativo, garante.

A empresa deve lançar mais produtos com a temática vegana no próximo ano, enquanto diminui o período entre as atualizações de seu portfólio.

Juntamente com a preocupação com os direitos dos animais (e como não pode deixar de ser), o empresário diz que há um cuidado para que cada ingrediente seja o menos agressivo possível à natureza. A marca diz que usa cola e tinturas sem solvente e à base de água, não imprime etiquetas e reutiliza embalagens.

Todo fornecedor é brasileiro –e suas confecções são visitadas pessoalmente, conta Caliman– não só a título de fazer ajustes nos projetos mais facilmente, mas também para evitar comprar da China, sabidamente país onde o trabalho é explorado mais brutalmente.

Leia trechos da entrevista abaixo:

VEGETARIANISMO

Não sou vegano. Eu como queijo, tomo leite, estou evoluindo nesse sentido, com influência dos meus filhos. Tenho três filhos, dois são veganos e uma é vegetariana. A Carol é vegana desde sempre, tem 32 anos. O Amauri tem 29, também vegano, e a Aline tem 21, vegetariana.

Se for ver, posso dizer que aprendi mais com meus filhos do que ensinei a eles, no geral. Tirei a carne do meu cardápio, mas sou um cara que normalmente não me alimento de maneira muito, digamos, correta.

À época da fundação da marca, achava que eu era um cara que causava bem pouco dano ao meio ambiente, mas se for ver, eu não era nada [já que comia carne].

DIFICULDADES

Nasci numa confecção, sempre foi minha área, conheço bastante o comércio. Em 2001, fundei a King55 com a ideia de ser uma marca diferente –o que não é nenhuma novidade; na moda, todo o mundo quer fazer algo diferente.

Procurei meus filhos para começar a marca com um novo DNA, um novo conceito. A intenção era mesclar minha experiência à juventude deles, que tinham atitude muito diferente mesmo entre outros jovens.

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Carol [filha de Amauri] já era vegana naquele momento, então foi uma exigência dela que a marca fosse vegana. Isso criou um certo desafio que imaginava que não conseguiria fazer. Há uma valorização do couro.

Hoje, é diferente, mas eu mesmo já tive isso, de olhar para um produto de couro sintético e automaticamente menosprezá-lo em termos de qualidade. Preço menor, menor resistência, possibilidade de ser feito em escala industrial. Nós buscamos trabalhar com um padrão alto, com modelagem e costura perfeita, visual diferente.

ASPECTO AMBIENTAL

Há 13 anos, era difícil falar que trabalhava com fio reciclado de garrafas PET [para camisetas, por exemplo]. A pessoa falava: ‘Isso é feito de lixo?’ Isso era visto negativamente.

Pode soar pequeno, mas quando desenvolvemos uma embalagem, não fazemos só uma sacola, tem que ser algo que tenha outro uso, como funcionar como embalagem de despacho para o correio. Tampouco usamos essas etiquetas que vão penduradas, ‘tagzinhos’ –isso só faz gerar lixo.

Sempre tivemos preocupação com o ecologicamente correto. Trabalhamos com produtos sem solvente, tintas e cola à base de água, sem solvente.

IDENTIFICAÇÃO

Com isso, fazemos um produto mais simples. Você pode olhar para nossos produtos e achar que são simples demais. Focamos nos aspectos mais importantes, como ergonomia, modelagem.

Este é um ramo [confecção] em que vou falar para um cara sobre reciclagem, qualidade, e as pessoas só querem saber de aumentar faturamento, reduzir despesas. O negócio dos caras é grana.

O setor aqui tá sucateado, não tem incentivo, mas isso é outro problema. Antes, tinha fornecedor na periferia, fábricas aqui por perto. A internet facilita, é claro, mas você precisa estar do lado do modelista se quiser fazer exatamente do jeito que quer. A gente desenvolve tudo no Brasil, e não dá para concorrer com preço China.

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O que vem acontecendo: cada vez mais conversamos com quem quer conversar com a gente. Cada vez mais trazemos pessoas e empresários para o nosso lado que tratam do mesmo assunto.

Quem já conhece, ok, mas quem não conhece é que é a grande conquista. Assim como é interessante que restaurantes comuns tenham um dia sem carne, é legal que as pessoas tenham a opção de poder comprar uma das suas peças de roupa sem causar sofrimento animal.

O desafio é encontrar alguém que tem informação, mas a grande maioria não tá nem aí. É uma dificuldade. E as pessoas estão preocupadas com um monte de coisa…

A marca tem a intenção de mostrar de maneira simples que dá pra fazer moda no Brasil com personalidade, sendo vegana e ecologicamente correta, mas isso é subliminar. Não vou ficar batendo na porta das pessoas falando que o certo é o que fazemos, “somos veganos”.

(Fotos: divulgação)