Indústria tenta proibir vegetarianos de chamar produtos vegetais de carne

Ricardo Ampudia
Hambúrguer defumado com omelete de tofu do Salad Days
Nas primeiras semanas de abril, a internet entrou em polvorosa com o polêmico projeto de lei francês que proíbe produtos que não sejam derivados de carne ou leite, de levarem esse nomes. 
 
Logo, fica proibido o leite de soja, o queijo de castanhas, a carne de soja e o filé de peixe vegetariano, nomes sempre presentes nas gôndolas de mercados naturais e restaurantes veganos.
 
A história, que atraiu a atenção dos haters baba-bifes, é um pouco mais complexa. Em junho de 2017, uma organização civil de direitos do consumidor da Alemanha, entrou com uma ação contra a também alemã Tofutown, empresa que concentra algumas marcas de produtos de origem vegetal, contra o uso dos termos “leite” de soja e “queijo” de soja.
 
O argumento era o de que existe regulamentação da União Europeia especificando o que é produto lácteo e que seus rótulos violavam esses dispositivos. O tribunal local remeteu a ação ao Tribunal de Justiça Europeu e a Tofutown perdeu.
 
Aproveitando a jurisprudência e embutindo o artigo em um pacote  de emendas à Constituição, o deputado francês Jean-Baptiste Moreau, do mesmo partido do presidente Emmanuel Macron (aquele bonitão), conseguiu aprovar seu projeto de lei que prevê a proibição dos termos “carne” “filé” “queijo” e “leite” de soja ou vegetal em território francês, sob o argumento que o termo confunde os consumidores.
 
Ao contrário do que você leu por aí, a lei não passou a valer, ela apenas avançou para isso. A aprovação foi em uma comissão da Assembleia Nacional. Para passar a ser cumprida, ela precisa ser debatida e votada em plenário, o que acontece entre 22 e 25 de maio.
 
Mas afinal de contas, por que as comidas vegetarianas têm nomes de carnes e leites?
A resposta é mercadológica: parâmetro e simplicidade
 
Quem responde a é David Oliveira, diretor de marketing da Superbom, empresa que há 93 anos fabrica produtos naturais no país. “Há 30 anos, quando tínhamos três produtos de proteína vegetal, não existia todo esse modismo sobre vegetarianismo, não tínhamos nenhum paralelo para identificar nosso produto.”
 
A solução para identificar os cilindros rosados feito à base de proteína de soja e trigo, embebidos em água, que usualmente recheiam pães acompanhados de molhos, foi a mais óbvia: salsicha vegetal.
 
“Nosso público era outro, ele só queria se alimentar da maneira mais natural possível, com uma carga proteíca adequada”, comenta.
 
A empresa lançou nesta semana uma linha com mais 13 produtos para o público vegetariano, avançando também na matéria-prima, sai a soja, que ficou demodê no mundo vegano, entra a proteína da ervilha, nova queridinha. [assunto para um próximo post]
 
Para o chef Celso Fortes, a frente da rede de franquias Açougue Vegano, com unidades em São Paulo, Rio e Santa Catarina, toda a grita pode se tratar de mera competição, uma reação do mercado ao crescimento da indústria e da gastronomia vegetariana.
 
Formado na escola de Alan Ducasse, na França, ele ainda diz que a proteção cultural que o francês faz da comida também pode explicar a lei controversa, mas não entende o sentido, já que, para ele, os nomes dos pratos não são tanto culturais, mas mais referenciais.
 
“O que a pessoa observa, o que a faz chamar a comida pelo nome é a referência do formato e da textura. A coxinha de jaca, ela é coxinha, porque ela tem aquele formato, frita por fora, com massa por dentro, tanto faz o recheio ou o ingrediente”, explica.
 
Fortes acredita que as pessoas deixam de comer carne não porque não gostam, mas por algum motivo que as coloca em conflito. Seja saúde, danos ao meio ambiente ou ética. “Elas estão mesmo é em busca de uma experiência gastronômica agradável, em sabor, textura. Se você consegue fazer uma gastronomia que alia esse fatores, que é gostoso, é saudável e impacta menos o mundo, não tem como competir.” 58% dos clientes da rede, estima, são onívoros.
 
Se você, jovem vegetariano, achou que esta polêmica estava superada e as caixas de comentários esvaziando, reserve mais um espaço na sua paciência. 
 
A associação de criadores de gado dos Estados Unidos acaba de enviar uma petição ao Departamento de Agricultura para impedir que carnes geradas em laboratório e de origem vegetal levem no rótulo as palavras “carne” ou “bife”.
 
Vou reservar meu melhor queijo de castanhas para gratinar quando esse circo pegar fogo.